Sambista e compositor carioca tinha temperamento forte e chegou a esnobar Mano Brown, vocalista dos Racionais MC’s
Trajetória. Ironicamente, Almir Guineto jamais registrou em disco o seu maior sucesso como compositor, “Coisinha do Pai”, lançada por Beth Carvalho e regravada com igual êxito por um dos parceiros na criação, Jorge Aragão. Por outro lado, uma das músicas mais lembradas na voz de Guineto não foi escrita por ele. “Conselho”, dos versos “deixe de lado esse baixo astral/erga a cabeça, enfrente o mal/que agindo assim será vital para o seu coração”, é uma obra de Adilson Bispo e Zé Roberto.
O que apenas revela a coesão da identidade artística e social do sambista, quase que unicamente ligado e preocupado com a sua gente e as questões relativas a ela, dando nenhuma ‘bola’ para o que vinha de fora. Tanto que desprezou um fã ilustre, quando Mano Brown, vocalista do grupo de rap Racionais MC’s, assumiu a sua idolatria. O comportamento autossuficiente de Almir Guineto era também a sua resistência.
Legado. Almir Guineto fundou o conjunto Fundo de Quintal ao lado de Aragão, Bira, Neoci, Sereno, Sombrinha e Ubirany no início de 1980 e saiu logo após a gravação do primeiro LP, um ano depois. Sua identificação com o estilo de samba formatado nas rodas do Cacique de Ramos, que ficaram conhecidas como pagode – a união de música, comes & bebes e muita festa – era tamanha que, mesmo após essa breve passagem com a banda pelo mercado fonográfico, ficou associado a esta nova fase do gênero até o fim da carreira.
Justamente porque a vontade de empreender uma carreira solitária não o desprendeu de suas raízes. São incontáveis os encontros proveitosos com Zeca Pagodinho, Beth Carvalho, Mauro Diniz, Sombrinha, Jorge Aragão e toda a legião de bambas que, em suma, cantava com esperança as agruras amorosas e os percalços cotidianos sofridos na pele. Guineto tomou partido de sua gente.
“Coisinha do Pai” (samba, 1979) – Jorge Aragão, Almir Guineto e Luiz Carlos da Vila
O famoso samba do Cacique de Ramos revelou ao Brasil vários nomes que se consagraram na música brasileira, graças ao olhar atento de Beth Carvalho, que se tornou madrinha do movimento. Foi desta forma que, em 1979, ela descobriu o samba “Coisinha do Pai”, próprio para a folia carnavalesca, com sua animação impossível de ser detida.
Composta por Jorge Aragão, Almir Guineto e Luiz Carlos da Vila, que depois sairiam em carreira-solo, a canção foi lançada por Beth Carvalho no álbum “No Pagode”, que vendeu milhões de cópias, certamente com a contribuição de “Coisinha do Pai” que, literalmente, se tornou um hit planetário. Tanto que a canção foi escolhida pela NASA para ser enviada à Marte, com o intuito de despertar um robô do “sono”. Funcionou.
“Alô, Judite!” (samba de gafieira, 1978) – Almir Guineto e Luverci
Com um instrumental de primeiríssima qualidade, com orquestra e tudo, Mussum registra em seu primeiro álbum, de 1978, a música “Alô, Judite!”, dos amigos Almir Guineto e Luverci. Ainda no campo do humor, o artista faz uma brincadeira com o deslumbramento da Judite da letra, que adentrou ao “dog society”, “tratou da celulite”, “ofusca a luz da Light” e está até “usando modelos do Clodô”, referência bem humorada ao estilista Clodovil. Esse samba de gafieira mostra não só a veia cômica de Mussum, mas também as qualidades do músico, e até certa preocupação social, ainda que disfarçada sob as ironias.